terça-feira, 24 de novembro de 2009

REMINISCÊNCIA


de você pouco restou:
a foto do útero pregada na parede
e eu dentro dele
me regerando

segunda-feira, 23 de novembro de 2009

Sístole, diástole



hipertenso
recolho o meu sangue
até o canto da veia
recolho-me
até o canto
encolho-me ao teu canto
o coração não deveria bater
nem quando estivesse com raiva
deveria ficar quieto
cumprindo silenciosamente
a sua função
o poeta bombeia poemas
sem precisar bater
Telhados recifenses



as copas das árvores se encontram
e formam o caminho
por onde automóveis
passam ensombrados
onde não há árvore
o sol assume outras formas de sombra
e descaminha os passos
onde não há sol
a chuva assoma os telhados
que encolhem o calor e
o espalha em calhas
onde não há chuva
flores de argila
carregam-se de mãos
que possam regá-las

sexta-feira, 20 de novembro de 2009

ENTREVISTA

- E o poema, como surge?
- Lapidar o silêncio até surgir essa forma.
- E os sons do poema?
- Som de poema é invencionice barulho de luz nos olhos do leitor.
- E o leitor, mero passivo?
- Do poema é pele e capa e alimento sem o qual falece à míngua frio e fome.
- E a palavra final?
- Ler até o pó virar sangue.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

ANAMNESE

peço ao ausentes
que me despeço
confesso-me demente
ao meu corpo
verto delírios
sintomas pedaços
disfarço a morte
engolindo o fim

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

DELIBERAÇÕES




primeira


deliberei não pensar
sem paredes na cabeça
como represar os sentimentos?

puxei os cabelos da paisagem
e contei um por um
eis a maneira correta
de amestrar a saudade


segunda


deliberei não sentir
sem paredes no sentimento
como libertar o pensamento?

a saudade puxa os meus cabelos
mas a cabeça não acompanha
eis a maneira correta
de abortar o sentimento

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Vinte séculos


Vinte séculos te amando
E o coração do mesmo tamanho
O amor transborda pelo corpo
E o que sobra
Primavera no jardim
Quando a poesia chegar




quando a poesia chegar
quero estar bem longe
vou deixá-la sozinha esperando
do mesmo jeito
que ela faz comigo
Disposições transitórias



quem ama com o coração
esquece do corpo
e o sangue não tem
pra onde correr

quem ama com a alma
esquece do corpo e
sem corpo a alma
descansa em paz amém

quem ama com o corpo
o coração aproveita
e foge pela janela da alma

quem ama com o coração
com a alma e com o corpo
esquece de si mesmo e o amor
pessoa de direito público
toma posse e revoga
todas as emoções em contrário

DEPOIS QUE MORREM

  sei para onde vão as mães depois que morrem a saudade forma um túnel e a luz que vem em sentido contrário as transformam em cinz...