quinta-feira, 29 de setembro de 2016

MEMÓRIAS

para chegar até aqui
tive que passar por ali
tive que abandonar o lugar onde eu estava
tive que falar todas aquelas palavras
para todas as pessoas que eu encontrava
tive que ouvir
depois esquecer
carregar memórias nos piora
parecer que tudo foi esquecido
permite que sejamos melhor recebidos


terça-feira, 27 de setembro de 2016

A FALADA POESIA ESCRITA

entre a poesia falada e a poesia escrita
há uma distância crítica
a poesia falada é muda
precisa ser falada
a poesia escrita é cega
precisa ser vista
e ao ser vista a poesia escrita
deixa de ser cega e passa a ser falada
e a falada ao ser ouvida passa a ser escrita
a poesia falada é cega
precisa ser guiada pela fala
a poesia escrita é muda
precisa ser falada
e ao ser guiada a poesia falada
deixa de ser cega e passa a ser vista
e a poesia escrita que era muda
passa a ser falada


quarta-feira, 21 de setembro de 2016

VAZIOS

as coisas que ficam em nossa boca
depois que falamos
as coisas que ficam em nossa alma
depois que existimos
estão dispostas
dispostas não é bem o termo
dispostas imóveis não estão dispostas
imóveis imóveis
que nunca serão ocupados


terça-feira, 20 de setembro de 2016

RISCO

não há delicadeza no risco
o que antes era branco e silêncio
torna-se algo
em que o inesperado
não vai aceitar desculpas
e o pensamento antes guardado
agora expõe a fratura
e a dor antes impensada
agora é palavra


sexta-feira, 9 de setembro de 2016

CURA

a cura na seringa
porém é preciso atingir a alma
e a alma não está dentro do corpo
está pendurada ao redor
como uma sombra que segue o corpo
na escuridão
é preciso ser preciso na introdução da agulha
penetrar a pele sem atingi-la
e informar à pele que está sendo atingida
sem tocar com a agulha
curvá-la de maneira que atinja a alma
e ao mesmo tempo a pele sinta                                                                                      
que alma está sendo tocada
e conseguir introduzir a agulha
nesse espaço entre a pele e a alma
e inocular a cura
sem que ela seja derramada


quinta-feira, 8 de setembro de 2016

ANTECIPAÇÃO

antecipo o abismo e me atiro antes
nem deixo as marcas das unhas nas margens
mãos nos bolsos
aguardo o encontro
do cóccix com o áxis


quarta-feira, 7 de setembro de 2016

RODEADO DE ELEFANTES

estamos rodeados de elefantes
alguns são azuis
outros opacos
a maior parte esquartejados
perturbam meu sono
seus passos no andar superior
só utilizam as escadas
enxergam no espelho do elevador
sua parte humana
acreditam que o homem e a arma
são o mesmo homem
e abrem seu poro para o afago
como abrem a boca para o beijo
sem saber o quanto é amarga sua língua
e indecifrável




DESENHO DO RELÂMPAGO

o relâmpago desenhou a luz na parede
desenhou o barulho no ouvido
desenhou a chuva
que apagou o branco da página


terça-feira, 6 de setembro de 2016

FORMANDO INIMIGOS

não vieram até a minha casa me mostrar
trouxeram anteparos contra o tempo
trouxeram apartamentos
não vieram até a minha casa me somar
trouxeram abismos complementos
objetos como aterros semoventes
trouxeram escadas até o fim
trouxeram a mim
com as mãos entrelaçadas a corpos
trouxeram outros departamentos
troços que formavam pensamentos
até ficarem roxos como flores de cimento
não vieram até a minha casa me buscar
trouxeram ossos cobertos de lonas de fumaça
trouxeram malas
repletas de telefonemas craseados
para o vizinho inflado
não vieram até a minha me ilustrar
trouxeram fotos armazenadas em cabides
roupas costuradas de pelos cerzidas com gelo
não vieram até a minha nunca vieram
ainda desespero
e tranquilo arranco minha cabeça pelo umbigo
expilo a alma para dentro
até formar um inimigo


DEPOIS QUE MORREM

  sei para onde vão as mães depois que morrem a saudade forma um túnel e a luz que vem em sentido contrário as transformam em cinz...